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Caboclo Akuan

Em um primeiro momento, parecia-me acima de qualquer questionamento a origem tupiniquim de Seu Akuan. Parando um pouco para pensar, esta certeza se esvai: se há espíritos orientais (linh

Pesquisa dedicada ao meu Pai e Guia Espiritual Caboclo Akuan, e minha amada religião Umbanda, a qual marca o início de meu infinito.
Hanna Batista Pinheiro – Médium do Terreiro do Pai Maneco

Já há algum tempo a curiosidade sobre a origem do Caboclo Akuan me motivava a pesquisar acerca do tema. Durante minhas buscas em contextualizar Seu Akuan à civilização asteca, fiz uma pausa e durante alguns segundos fiquei olhando para o nada. O livro Grifos do Passado, do Pai Fernando Guimarães, estava à direita de minha mesa. Peguei-o para dar uma folhada, a fim de encontrar mais alguma informação que me poderia ter escapado. Deparei-me com o seguinte trecho:

-“Quando sabia que ninguém podia me ver, punha minha filha no chão e ficava bom tempo brincando com ela feito curumim. Foi precoce sua morte. Chorei muito e senti sua falta. Mas não ia querer conhecer a razão, sabendo que os deuses estavam cuidando dela”, emocionado parou de falar. Os cambonos, vendo a emoção da entidade, cuidaram para ninguém do terreiro chegar perto. Ele continuou:

Quando desencarnei, tive um reencontro. Esta menina, que quando encarnada foi minha filha, hoje trabalha comigo, em forma de águia…”.

Lendo esta passagem, da qual não me recordava, tive a sensação de ter alguma informação no meu material que falasse sobre a interpretação asteca sobre morte infantil. Achei: crianças pequenas – antes de começarem a estudar – eram consideradas puras. Sendo assim, quando morriam, iam para um jardim florido denominado Tonacaquauhtitlan. Lá viviam por toda eternidade, sob forma de pássaros, voando sobre as flores. Desta vez fui eu, como filha do guia espiritual Caboclo Akuan, que me emocionei.

O presente texto objetiva apresentar especulação acerca da origem histórica de Caboclo Akuan, analisando onde ele pode ter vivido e os elementos míticos que o acompanham. Apresentando objetivamente as informações acumuladas, as seguintes linhas se debruçam acerca apenas da relação entre os dois objetos da pesquisa.

CABOCLO AKUAN: ONDE VIVEU E ONDE NÃO PODE TER VIVIDO

Em um primeiro momento, parecia-me acima de qualquer questionamento a origem tupiniquim de Seu Akuan. Parando um pouco para pensar, esta certeza se esvai: se há espíritos orientais (linha do oriente), porque todos os caboclos da linha de Ogum tinham que ser brasileiros? Foi em busca de respostas que na América Central me encontrei com a estória de meu Pai Akuan contada pela história mundial.

O questionamento acerca da brasilidade da entidade surgiu, quando me dei conta que o cobre era uma marca registrada nos trabalhos espirituais de Caboclo Akuan. Processos metalúrgicos não eram dominados por índios brasileiros, os quais não conheciam o ferro, o ouro ou o cobre. Seus traços mongóis, suas vestimentas e seu histórico apontavam mais diretamente para as civilizações pré-colombianas, que em uma grosseira generalização podemos dividir em maia, inca e asteca.

A imagem do Cabloco Akuan é descrita como um homem de pele parda, estatura mediana, rosto redondo. Esta figura é essencialmente distinta da de um típico maia: ao nascer a criança Maia passava por um ritual de achatamento do crânio, o que deixava a testa aplainada e o rosto intensamente alongado; o padrão de beleza maia vislumbrava olhos estrábicos, que eram forçados através da técnica de colocar uma pequena bola de cera entre os olhos do bebê; a cabeça era vestida com pesados chapéus e as roupas eram intensamente coloridas, grandes e ornamentadas.

Desacredito também que seja um Inca, civilização que possuía o costume de matar ou abandonar crianças nascidas fora do padrão. Uma criança inca portadora de Síndrome de Down, como filha do Caboclo, mesmo que fosse acolhida no berço da família, dificilmente sobreviveria aos primeiros anos de vida devido as severidade da infância: as crianças raramente recebiam colo, o primeiro banho era com água fria. Elas deveriam andar completamente sozinhas ainda no primeiro ano de vida, e em caso de doença, lhes era dado o cordão umbilical com alimento.

Minha crença na origem asteca de Seu Akuan, não parte das negativas recém expostas, ela nasce das infinitas afirmativas que encontrei ao longo de minha pesquisa. Porém, cabe ressaltar que escrevo estas linhas com a “mente” de uma leiga em história, que espera que baste a mão guiada pelo coração. No mundo das certezas não é permitido escrever uma pesquisa séria sobre uma entidade de umbanda. Então porque que escrever? O que me faz arriscar? Porque tenho um trunfo que aprendi com Seu Akuan: ter fé.

O MILITARISMO ASTECA E SEU AKUAN

O Império Asteca durou de 1325 a 1521. A capital do reino era Tenochtitlán (atual Cidade do México). Guerrilhar era a principal atividade e a estrutura social era hierarquizada. A metalurgia era bem desenvolvida, apesar dos metais não terem grande valor econômico. Seus exércitos eram divididos em pelotões, falanges. Dentre as tropas, duas eram de elite: “Guerreiros Águias” e “Guerreiros Panteras”.

GUERREIROS AGUIAS

Há um trecho do livro Grifos do Passado que me recordo bem: “Antes de subir, o Caboclo (Akuan) faz um gesto como, se soltasse uma ave de seu antebraço (…).” . A ligação do Caboclo com o animal é tão intensa, que em seu ponto riscado, a águia é um elemento “desenhado” no canto da tábua.

A sociedade Asteca possuía diversas classes, uma delas eram os “Guerreiros-Águias”. Constituíram um pelotão de elite do exército Asteca. Vestiam roupas leves e quando usavam armadura esta era de couro, recoberta com penas de águias. Levavam a cabeça um capacete de madeira em formato da cabeça da ave, revestido de penas. Normalmente lutavam com lanças compridas. Tais soldados eram acompanhados em suas batalhas pelos “Guerreiros-Jaguar”.

GUERREIROS JAGUAR

Jaguar é um gênero de felino da família Panthera. Os Guerreiros Jaguar, possuíam este nome devido a suas vestimentas de batalha: trajavam-se com couro de jaguares mortos, e utilizavam um capacete confeccionado com os ossos da cabeça do animal (ligado ainda à pele do jaguar com as presas e os pelos intactos).
Seu Akuan é o guardião dos “Caboclos da Pantera”, falange de entidades comumente chamadas nos trabalhos espirituais de demanda dirigidos pelo Guerreiro. A descrição da imagem “dos Panteras” está em tanta consonância com a dos Guerreiros-Jaguar, que seria redundância descrevê-la novamente.

OS ANIMAIS QUE ACOMPANHAM SEU AKUAN E AS LENDAS ASTECAS

Já dizia Seattle, chefe espiritual de uma tribo indígena norte americana:

“O que é o homem sem os animais? Se todos os animais fossem os homens morreriam de uma grande solidão de espírito. O que ocorre com os animais, breve acontece com o homem. Há uma ligação em tudo. O que ocorrer com a terra recairá sobre os filhos da terra. O homem não tramou o tecido da vida; ele é simplesmente um de seus fios.”

Todo animal carrega consigo um simbolismo. O homem não se contentou em observar o vôo ou escutar o galope, ele sim tinha sim que metaforiza-los. Assim sendo, tanto o cavalo quanto à águia, animais que acompanham Caboclo Akuan, foram protagonistas de lendas astecas. Em função do tema segue-se a presente análise.

A ÁGUIA

A águia é considerada em diversas culturas como a “Rainha dos Pássaros”, a mensageira, a substituta do fogo celeste. Ela não é um símbolo apenas para os Astecas, tendo em diversas culturas interpretações muito interessantes, na maioria das vêzes sendo ligada ao místico e a espiritualidade.

Para os índios norte-americanos, a águia é quem carrega a Iama xamá – fogo que representa a morte e o vôo estático. Consideravam as penas das aves como um objeto de cura. Via-se a ave como um remédio, que fazia o ninho no alto de uma árvore e cuidava de seus galhos, assim como o Xamã, possuidor da mais alta hierarquia cuidava de sua tribo. Outro ponto interessante, é que consideravam a ave como iniciadora e regeneradora, sendo que era a única que podia vagar por entre o mundo dos espíritos e ainda sim voltar para o mundo dos vivos.

Para os incas, a ave possuía o poder de absorção de energia e assim de regeneração. Era ela que concedia o dom da espiritualidade. Não apenas a América concedeu a este animal lugar ao lado dos deuses. Na tradição helênica a águia é um atributo de Zeus, Deus possuidor de raios e relâmpagos. Os ameríndios do norte também relacionavam a ave aos raios e trovões, uma vez que ela – a representação do Grande Pássaro –, sobrenaturalmente, teria o poder de dissimular nas nuvens de tempestade, e sendo a encarnação do Grande Espírito podia gerar as trovoadas.

Em Roma antiga a águia era o emblema de Júpiter. No Egito era a forma material de Hórus e também a mensageira de Rê (Deus do Sol). Os Nórdicos ornavam seus capacetes com suas penas em uma homenagem a – Deus dos Raios e trovões.
Os Astecas viam a águia como o próprio Sol (Tonatiuh). Uma lenda asteca dizia que o Deus Huitzilopchtli conduziu o povo a uma ilha no lago de Texecoco. Dizia o Deus que quando encontrassem uma águia se alimentando de uma cobra era ali que deveria ser construído o Império. Esse sinal divino aconteceu onde hoje é a Cidade do México. Onde foi construída a capital Asteca Tenochtitian. A bandeira mexicana tem o símbolo da Águia comendo uma serpente em memória ao povo asteca e sua lenda, em memória a Tenochtitian. Uma vez Seu Fernando disse que Iansã – Orixá dos raios e trovões – era “os braços” do Terreiro do Pai Maneco. Toda vez que olho para a estátua da águia do seu Akuan em cima do congar, e lembro das lendas e histórias que envolvem este animal em diversas culturas, penso: O Terreiro do Pai Maneco tem braços? Não teria ele asas?

O CAVALO

Pai Fernando Guimarães em seu livro Grifos do Passado, relata que durante uma gira, Cigano Woisler foi indagado por não estar em seu humor habitual. Explicou a entidade que, diferente do que de costume, não veio cavalgando. Bravo pelo Cigano ter tentado roubar seu cavalo, Caboclo Akuan penalizou-o pelo “delito”. Diz o Cigano:

Eu queria aquele cavalo branco. Ele é lindo. E o pior não foi isso. Além de ter ficado sem meu cavalo, vim a pé para o terreiro, acompanhado por uma falange de pretos-velhos enfileirados atrás de mim, rezando para eu me regenerar. Foi humilhante”.

Assim como a águia, o cavalo tem profunda ligação com a mitologia. Sua função mítica é, geralmente, ligada à condução dos deuses de um mundo ao outro. Posseidon era o deus grego dos cavalos, com o poder de se metamorfizar em um. Os Nórdicos também não deixaram os eqüinos de fora de suas lendas: Skin, o incrível cavalo branco. Segundo a tradição helênica Júpiter passeava em seu carro puxado por cavalos brancos. Apolo era guiado por quatro cavalos que representavam a luz e a chama – Aretôn, Eoo, Flegon, Pirois.

Os Astecas previram a vinda de um Deus de muita luz – Quetzalcoatl. Este futuro condutor da nação era esperado de 52 em 52 anos. Dizia-se que viria montado em um animal branco. O imperador Moctezuma II concluiu precipitadamente que o conquistador espanhol Fernão Cortez era esse Deus (afinal, havia chegado montado um cavalo branco e com sua armadura reluzente exatamente em um dos anos esperados para a chegada de Quetzalcoatl – 1519). De uma maneira simbolista, seria muito coerente o Caboclo Akuan, se asteca, fosse trazido ao terreiro em um cavalo branco, uma vez que é sim um guia de muita luz.

O SETE PARA UMBANDA E PARA OS ASTECAS

Quando entrei para Umbanda perguntei qual era a ligação dos Orixás com Zambi. Não me recordo quem, mas a explicação dada foi simples, sistemática, e nunca saiu da minha cabeça:

“Pense em uma lâmpada. Ela é Zambi. Agora pense em você cobrindo a lâmpada com saco plástico preto, sem escapar a luz. Faça sete furos. Cada furo vai sair um forte feixe de luz. Cada um dos sete furos corresponde a um respectivo Orixá. Agora cubra um dos furos com mais um saco plástico, e vamos supor que estamos cobrindo a luz de Ogum. Faça milhões de furos neste ultimo saco plástico. Sai um feixe de luz por cada furo. Cada feixe de luz corresponde a um filho deste Orixá. Um dos feixes de luz é você”.

Se você perguntasse para um asteca da onde surgiram os seus ancestrais, ele responderia que haveriam surgido em uma das sete cavernas a noroeste da cidade de Mechio, e assim deu-se origem a civilização asteca. Sete é sem duvida um número muito forte na história da humanidade, forte para os astecas, e é o numero limitador da umbanda.

A UMBANDA, OS DEUSES ASTECAS E AS DIVERSAS RELIGIÕES.

Na Umbanda, cada Orixá está coligado com uma força natural: Ogum ao fogo, Iansã aos ventos e raios, etc. O mesmo ocorria com as divindades astecas. O politeísmo religioso vem sempre acompanhado de arquétipos. Mesmo os monoteístas, como os católicos, o fazem através dos santos. Muito embora os deuses mudem de uma religião para a outra, pode-se observar que os arquétipos permanecem os mesmos.

ALGUNS DEUSES ASTECAS E A UMBANDA

Tlazoeteol era uma deusa asteca que adquiriu várias arquétipos: mulher madura, símbolo da fertilidade e da sedução – a quem a descrição em muito se assemelha a Oxum-; grande mãe, protetora e cautelosa – o que lembra Iemanjá -; mulher guerreira, carregando em uma mão o escudo e em outra a lança. Xochiquetzal é a deusa meso-americana do amor e da beleza. Mayahuel é a divindade asteca protetora dos ventres grávidos, muito associada à imagem de Tlazoeteol (em sua visão como arquétipo da mãe).

Se Ogum fosse um deus asteca seria ele Tezcatlipoca, o deus das estrêlas, senhor do fogo, deus guerreiro, figura mais temida do panteão asteca. Mictlantecuhtli, o deus da morte, senhor de Mictlán – o reino silencioso e escuro dos mortos -, lembra-me muito a figura de seu Omolu.

Todas as religiões estão ligadas pela espiritualidade, afinal acima de nossas cabeças está o mesmo céu e nossos passos, do primeiro ao último, se dão sobre a mesma terra. Os símbolos míticos se repetem. De Zeus aos Exus, de Hefesto a Ogum, de Bastet a Iemanjá, cada figura religiosa não é singular. A pluralidade de religiões representa um sistema único interpretado e praticado de diferentes formas.

O grego Zeus, o romano Júpiter, e os “umbandistas” Exus carregam em sua mão um tridente. Nos três casos o tridente representa um símbolo de proteção das divindades. Já a simbologia do tridente na igreja católica é distinta. Esta diferença se deu devido ao fato de que o símbolo foi trazido para o catolicismo com o objetivo de difamar as tribos africanas em época de conquista européia – a igreja, a fim de apoiar o massacre africano, maculou os símbolos da religiosidade africana, dando assim “sustentabilidade” ao argumento de que aquele povo pactuava com o diabo.

Ogum pode ser comparado com Hefesto (deus grego da metalurgia, filho de Zeus e Hera, homenageado nos tempos de demanda ) e a Parasurama (deus hindu). O grego Priapo (deus dos animais, dos rebanhos e das colheitas) e o egípcio Geb ( zelador da terra.) muito se aproximam da imagem de Oxossi. “Perto” de Oxum temos Flora (deusa grega da feminilidade e da beleza), Khnum (deusa egípcia da água dos rios), Isis (deusa egípcia da fertilidade e da riqueza) e Ishtar (deusa principal dos babilônios e dos assírios, deusa fenícia do amor e da fertilidade).

Com as características de Xangô encontramos as seguintes divindades: A deusa romana Minerva, tutelava pela sabedoria; Thor, deus romano dos raios e trovões; Ptah deus egípcio das obras em pedra; Sobek Deus egípcio da sabedoria. Ganesh deus da ponderança e da sabedoria. Iemanjá, nos remete a Bastet (deusa egípcia), Hera (deusa grega) e Juno (deusa romana) – deusas da maternidade. A descrição de uma filha de Iansã é em tudo idêntica a de uma filha de Seth, deusa egípcia da guerra.

Poderia continuar por muito as comparações, porém fugia do objetivo. Os deuses citados são representam tão somente minúscula parcela de todos os paralelos que podem ser feitos entre as religiões. Enfim, o que se pretende colocar é que tudo esta conectado. A umbanda não esta isolada, e talvez porque trabalha com diversos espíritos se conecte de alguma forma a diversas culturas, dentre elas a Asteca.

POR FIM

A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade. A dor é inevitável. O sofrimento é opcional.
Carlos Drummond de Andrade

Por fim, encerro legando reflexão: Quando olhamos para seu Akuan entendemos como dar amor sem perder as forças e como arriscar com prudência, porém entender não é internalizar. Será que um dia realmente aprenderemos como “doer” sem “sofrer”? Será a missão mais difícil a do mortal esquecer a dor ou a do espírito Caboclo entender o sofrimento?

Meu filho, o céu estrelado é deslumbrante, tão bonito que você fica perplexo diante de tanta grandeza. Na verdade, este conjunto marca o início do infinito. Se você tirar as estrelas, o céu fica feio e sem marcas. As religiões são como o céu estrelado. Marcam o início do infinito.
Caboclo Akuan

2 thoughts on “Caboclo Akuan

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