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O Pai Maneco na Pedreira III

Desde ontem após o almoço, venho conversando com os meus amigos que estiveram na gira de Pedreira. Trocando opiniões, ouvindo impressões, lembrando como bem fez o Pai Leonardo, refletindo como bem fez o Rodrigo. E por mas que todos tenhamos muito o que fazer numa segunda, iniciando a semana de trabalhos, estou percebendo um ponto comum: ninguém consegue parar de pensar no que aconteceu. Ninguém consegue voltar para o chão. Está todo mundo flutuando, envolto em uma nuvem de graça.

Vou relatar a vocês um pouco do desenho que vi se formar neste trabalho, desde o início, na sua organização.Há algum tempo a mãe Lucilia me falou sobre esta gira e, alinhada com o Helinho Pimentel, marcou a data.

Estive particularmente envolvida nos preparativos do evento junto com a querida mãe pequena Camila. E num determinado momento a mãe Lucilia nos falou que gostaria de fazer uma homenagem aos Pretos Velhos, pais da Umbanda, no dia dos pais. Que seriam eles chamados, e que chamaríamos com especial carinho os Pretos de Xangô.

Uma semana antes da gira de Pedreira houve um trabalho de hierarquia. Nesta ocasião, sem que ninguém soubesse do roteiro pensado para o evento com todos os médiuns do Terreiro, os pais de santo relataram que alguns bons Pretos de Xangô vinham se manifestando no Terreiro. Pretos altivos, libertos, alegres e muito determinados. Ficava clara que a intuição da mãe Lucilia estava certa.

Nesta gira de hierarquia, não posso deixar de citar, senti como todos os Pais e Mães de Santo, Pais e Mães pequenos, e capitães e capitãs do Terreiro estão cada vez mais e mais alinhados, afeiçoados uns aos outros, vibrando juntos.

No sábado à tarde estivemos na Pedreira, montando a estrutura de grades que protegeriam os presentes de quedas indesejáveis daquele enorme palco e delimitando o estacionamento. Uma equipe de primeira linha, de fazer inveja à produção do Rock in Rio.

Após montado tudo, fiquei pensando em Leminski, Umbanda, Ogum, Seu Fernando, Lucilia, Rock, Cultura, tudo junto e misturado. Dormi nestes pensamentos, sonhei com isto tudo, acordei cedíssimo e fui para a Pedreira, confesso, extremamente ansiosa e com medo que alguma coisa de nossa organização física não atendesse às necessidades da direção do trabalho e dos espíritos.

Mas que medo bobo, Carolina! O dia estava lindo, sacado do meio de uma previsão de chuva e frio que sempre acompanha o mês de agosto em Curitiba. Os médiuns vieram em peso, nosso estacionamento suportou tranquilamente todos os veículos, não tivemos problemas de trânsito, de estrutura, de emissão sonora, nada nada nada.

O trabalho, ah, o trabalho… Eu chorei, como disse ao Rodrigo. Quem não choraria? Estava feliz, e até comentei que era uma alegria de nascimento de filho ou de sobrinho. A Antonia, minha sobrinha, foi o último bebê a nascer na família, então tínhamos aí uma gira bebê nascendo. Linda e segura, como a Antonia.

Começaram as homenagens, as incorporações, e então amigos, sinceramente, eu não consigo mais separar fatos, sensações, impressões. Virou tudo para mim um êxtase, uma alegria sentida e compartilhada, sorrisos, abraços. Vi uma corrente completamente alinhada, vibrando junto, como a hierarquia da gira da semana anterior. Igualzinho!

Penso que a Umbanda, nossa religião, não é somente uma religião. É um pulsar do coração do universo que condensamos em algo mais humano e corriqueiro, como uma religião. Penso que a arte não seja somente uma forma de manifestação humana. É a forma de traduzir este universo plural e contraditório aos homens.

Na Pedreira Paulo Leminski ontem eu vi arte e religião vibrando o universo todo num palco gigante. Dá para sair do mesmo tamanho daquilo tudo?

Não, não dá, rs. Ninguém saiu do mesmo tamanho. Estamos todos flutuando em vibrações de Ogum, Iansã, Xangô, Pretos Velhos e Iemanjá. E de todos os outros Orixás e Guias da Umbanda.

A pedra, aquela que é imóvel, de Xangô, mostrou que se move. Do princípio ao fim, ou do fim ao começo, como falou hoje o João. Dentro de nós, nas nossas certezas mais sólidas, como disse a Sheilla. E rapidamente, como disse a Ana.

Os Pretos Velhos, de aparência lenta, mas que nos movimentam constantemente em direção à consciência superior, mostraram para nós que dogmas, certezas, ódios, nada disso passará! Percebemos que o universo, aquele da arte e da religião, está se movendo. Neste embalo estamos até agora.
Eu não quero mais voltar para a terra.

Carolina Wanderley
Gira de Segunda-Feira

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