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RELATO SOBRE O TRABALHO DE OBRIGAÇÃO/2015

Trabalho Inédito

O trabalho das feituras de ‘Obrigação’ realizado nesse domingo, 04.10.2015, foi um evento único em nosso Terreiro até hoje. Muitos rituais de obrigação já foram realizados no passado, mas nunca de forma tão coletiva. Foram mais de 130 médiuns presentes, além dos dirigentes de gira, ogãs, sambas e o pessoal de apoio, sem falar da turma que estava lá atrás, na cozinha improvisada.

Fortalecimento Espiritual

Quando o Terreiro Pai Maneco se junta, como nos trabalhos de mata e de praia, ou na inesquecível homenagem aos Pretos Velhos realizada da Pedreira Leminski, acontece sempre uma grande movimentação de energia no astral. Essa manhã, ainda que com menor número de ‘pessoas de branco’, vai ficar igualmente marcada na história de nossa Casa como um dia de importante fortalecimento da egrégora espiritual do TPM.

Hino de Umbanda 

O Salão Grande estava tomado, havia muito pouco espaço livre. Quando essa massa de umbandistas começou a entoar o hino de Umbanda, aquela emoção típica dos grandes eventos tomou conta de todos mais uma vez, fazendo arrepiar os pelos do braço e dando aquela taquicardia que faz a gente sorrir. Mais tarde, em dado momento trabalho, um Caboclo de Oxóssi me diria assim: “Um dia, filho, quando você passar para o nosso lado, vai ficar admirado em ver quanta luz emana dessa casa! E vai se sentir muito orgulhoso de ter participado da história dela!”. Eu imagino que ao dizer isso ele se referia a esse momento vibrante que foi a abertura do trabalho, em que o pessoal cantou com os pulmões cheios e muita alegria por fazer parte desse terreiro maravilhoso.

Missão impossível 

A seguir, Sr. Sete Ponteiras do Mar desceu em mãe Lucília, firmou o trabalho e então passou a comandar o que parecia uma missão impossível: Fazer dezenas e dezenas de Exus incorporarem de uma só vez em seus médiuns, riscarem cada um o seu ponto em uma tábua, sem ajuda de cambones. Já os dirigentes deveriam confirmar a identidade de todas essas entidades, então a equipe de apoio catalogaria todos esses pontos riscados em ficha própria, entrevistando um por um os espíritos sobre guias e elementos de trabalho. Após, teríamos que acompanhar os compadres até o Jardim dos Exus e oferecer a comida de amalá para que pudessem confirmar o pacto de obrigação com seus médiuns. Por fim, deveríamos fazer retornar todas essas entidades ao salão do terreiro.

Depois dos Exus, tudo isso foi repetido com as Pombas Giras, depois com os Pretos e Pretas Velhas e por fim com Caboclos e Caboclas.

Parecia mesmo algo impossível, mas não foi. Acabou dando tudo certo.

Cenas Inusitadas

Mais do que certo, o trabalho foi muito bacana, tudo muito diferente!

Quem imaginaria um dia ver um engarrafamento de Exus no Jardim deles, com o pessoal encarnado ajudando: – Por aqui Sr. Capa Preta, com jeitinho acho que o senhor consegue se ajeitar ali. – Sr. Meia noite, só um instante. – Sr. João Caveira, por gentileza, o senhor poderia ir um pouco mais para lá, obrigado. – Pode passar Sr. Marabô!

Já o Exu do Congo assistia a tudo impassível, com seu charuto entre os dentes. Eu puxo conversa: “Olá, meu velho, só assistindo? ” E ele: “Pois é, né, filho, estou aqui aguardando a formatura.”

Ao voltar para dentro do terreiro, no corredor em frente a cantina cruzo ao mesmo tempo irmãos de fé e Pombas Giras como se nada fosse: “E daí, irmão, tudo?” – “Salve Dona Maria Padilha, seu axé minha mãe!” Mais tarde ainda veríamos Pretos Velhos caminhando sozinhos pelo estacionamento e Caboclos passando de lado entre os carros para não esbarrar nos retrovisores.

Café Pela Metade

Mas não foi de só obrigação espiritual essa manhã de domingo. Eu que o diga. Como uma lesão no pé a me dificultar as caminhadas, lá pelas tantas senti necessidade de descansar um pouco. Encosto no balcão da cantina, relaxo o corpo e peço um café, que, aliás, estava delicioso. Mas foi dar dois ou três goles nele e logo chega alguém, às pressas, me avisando: “Pai Léo, Pai Léo, o Sr. Sete Ponteiras está lhe chamando lá dentroAgora!! Pensei: “Ah meu Deus, o ‘hóme’ me pegou no pulo!” Volto o mais rápido que consigo, pronto para levar aquela bronca merecida. Afinal, um pai de santo tem deveres sérios e tomar café não está entre eles. Mas não foi nada disso o que aconteceu: – Meu filho, sente aí no meio. Nós vamos fazer um trabalho de cura para você!Quase chorei. E prosseguiu o Caboclo de Ogum: “Esse é meu dever, meu filho. Sim, o meu dever é cuidar de meus filhos!” Quase chorei de novo. E logo em mais uma vez, ao ouvir o ponto de meu Pai Tupinambá ser cantado forte por meus irmãos de terreiro e ver a sua falange descendo firme e bradando alto. Eu sei que minha paixão pela Umbanda me faz ser um pouquinho suspeito, mas não é demais essa religião? Ela nos ajuda e emociona sempre e de tantas maneiras! Umbanda é força, Umbanda é amor, Umbanda é caridade!

Alertas Importantes

Antes de continuar, umas palavras aos filhos de terreiro que não foram chamados para esse dia de obrigações, ou foram só para uma entidade e não para todas: Não se sintam desprestigiados e não se magoem. Os dirigentes de suas giras sabem o que fazem. Além disso, a cada ano haverá uma nova oportunidade.

Já aos médiuns que prestaram obrigação, fica uma advertência, ouçam com atenção: Não imaginem que a obrigação seja alguma espécie de condecoração ou homenagem a vocês, porque não é! Ela é somente um rito de firmeza e confirmação de compromisso e nada mais. Não faz de vocês mais merecedores de respeito do que sempre foram. E muito menos, muito menos mesmo, pensem fazer parte de algum tipo de casta mediúnica do Terreiro Pai Maneco ou coisa parecida, porque isso não existe! A humildade é o eixo principal de qualquer caminho mediúnico e quem se achar superior aos demais irmãos estará, por sua vaidade, desonrando suas entidades, prejudicando a irmandade da qual fazem parte e envenenando os seus próprios caminhos a partir daí. Na Umbanda todo mundo é soldado, todo mundo é igual, não se esqueçam nunca disso!

Agora sim, relato o fim do trabalho.

Uma Lista e Tanto

Depois de todas as obrigações feitas, sentamos todos no chão para ouvir a longa relação de entidades que haviam sido confirmadas com seus médiuns. Como foram muitas, foi um momento longo. Estávamos todos com fome, pois já passava das 14h00, mas mesmo assim – posso estar errado – não percebi ninguém querendo sair dali nessa hora. Afinal, aquela não era uma lista qualquer. Era uma lista de encontros sagrados, de caminhos cumpridos, de comunhões sacramentadas. Era o resultado concreto de um trabalho conjunto de encarnados e de desencarnados, de mestres e aprendizes, de médiuns e dirigentes, de espíritos iluminados e suas falanges. Trabalho de Pai Fernando, de Pai Maneco e Sr. Akuan; de seu Junco e Sr. Cachoeira; de Pai Luiz e Sr. Tranca Ruas das Almas. Trabalho de Mãe Lucília e Camila, de Sr. Sete Ponteiras do Mar e Sr. Folha Verde; de Dona Maria Redonda e de Pai Joaquim; de Caboclo do Vento e de Sr. Caveirinha. Trabalho de todos que se dedicam a essa Casa que, como disse aquele Caboclo, um dia ficaremos admirados ao ver a enorme luz ela irradia e então sentiremos um grande orgulho de ter feito parte dela!

Faltou eu responder a ele: – Nós já sentimos esse orgulho, meu pai, nós já sentimos muito orgulho disso!

Saravá!

Leo Guimarães.

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