GIRA DE MARINHEIRO – Por Vinicius Petruka
Segunda-feira, 24 de abril de 2017, gira neutra.
Mais uma gira prestes a começar, os sons dos atabaques e a energia da corrente contagiando e iluminando o terreiro. Confesso que tudo é novidade para mim, são 10 meses de terreiro, meses que trouxeram muita felicidade, educação, emoção, mas também ensinou que todo dia é dia de aprendizagem.
Eu ainda não incorporo e ouço muito falar que não é necessário incorporar para a caridade e amor ao próximo, estar ali doando meu tempo e sendo recompensado com sorrisos, abraços e muito axé, valem cada segundo. Conheci várias pessoas de fé, conversei com entidades lindas. Alguns dias atrás comentei com a Denise, uma grande amiga, que gostaria de escrever sobre os dias no terreiro e como disse anteriormente cada dia é uma aventura diferente, então aqui estou.
A primeira parte da gira foi de uma energia única, a Mãe Lucilia abriu as portas do terreiro para uma apresentação do ritual de fé, que deixou todos emocionados e cheios de encanto, dos índios da tribo Fulni-ô. Os sons dos pássaros usados na vibração, emitidos pelos próprios índios me fizeram ver a floresta e a paz dos Orixás, que noite linda estava começando. As entidades foram chamadas para incorporação e vibração nos consulentes, quem me dera poder conversar com cada ser ali presente, unidos pela fé, amor e esperança, cada um com sua batalha particular e necessidades individuais. Assim que retornaram os trabalhos, as entidades foram chamadas para as consultas da noite.
A médium Denise Oliveira, da lojinha, que pela segunda vez recebia a vibração de marinheiro, estava preparada para receber a vibração e eu para cambonea-lo. A vibração estava muito forte, as entidades chegaram, firmaram seus pontos e tornaram o momento único de paz e amor à vida terrena. A Denise, em um momento de conexão, fechou os olhos, respirou, encontrou o equilíbrio, com calma e sabedoria, aguardou e respeitou o momento da entidade, demorou um pouco, mas logo incorporou o marinheiro, o qual não revelou o nome ainda.
Na primeira incorporação eu também tive o privilégio de estar camboneando. A corimba estava conectada com a casa, um ponto mais lindo que o outro, logo ele chegou. A Denise incorporou o marinheiro e com um belo sorriso tímido se apresentou a casa. Saudou o Congá e foi até seu lugar para firmeza, sentou pediu sua água do mar e usou um coité para colocá-la em seu ponto, vela azul e conchas também estavam firmando o ponto. As guias de proteção foram pedidas, a minha, do cavalo (Denise) e a proteção da Regina (mãe da Denise) para um banho de descarrego. Recebi um passe com água do mar e então estávamos prontos para as consultas.
Não entrarei em detalhes sobre a primeira consulta pois não tenho permissão, porém o caso era muito sério, uma questão de vida ou morte. Lembro que a entidade falou que não temos como interferir nas vontades de Oxalá, ele sabe de todas as coisas, sua vontade sempre prevalecerá e que as almas mais velhas são as que morrem primeiro. Após a consulta já haviam sido atendidos os demais consulentes, então sentei de frente com a entidade e conversamos um pouco, aliás sou muito grato por todas as oportunidades que a umbanda já me proporcionou de conhecer as entidades lindas que trabalham conosco, tanta sabedoria, tantos mistérios, tanto amor e tanta verdade.
O marinheiro estava poético, contou que no mar eles bebiam muito e apesar de querer uma bebida estava ciente que o cavalo não bebe e que respeita às opiniões dela, como dizem o equilíbrio do café com leite. Contou que viu muitos marujos se perderem no mar e ficarem para trás, e começou a refletir sobre o convívio um com os outros, a importância necessária dos cuidados que devemos ter com nossos corações, nosso amor, o encontro de quem nós somos e o que podemos corrigir nessa vida terrena para consertar fardos passados.
Perguntei qual a melhor forma de curarmos as feridas e ele respondeu que devemos sempre cuidar do nosso livre arbítrio, ele é essencial para a vida humana mas precisamos saber até onde realmente devemos fazer tudo o que achamos certo, cuidar dos corações de quem navegam conosco também fará dos dias mais leves e felizes. Usou uma parábola que dizia o seguinte, se for pescar e fisgar um peixe filhotinho você pode decidir ficar ou devolvê-lo ao mar, mas que um peixe filhotinho assim como uma mãe com ovas estão em fase de crescimento e é da natureza esse desenvolvimento, evitar atrasar os processos terrenos já ajudam no entendimento do que nós não conseguimos enxergar referente ao plano espiritual. Se colocarmos uma situação à frente de um grupo de pessoas, cada uma vai opinar e concluir de maneiras diferentes, e assim devemos sempre respeitar e aceitar o outro como ele é.
A mãe Lucilia estava solicitando que as entidades finalizassem os trabalhos e desincorporassem, assim eu agradeci as boas e belas palavras daquele marinheiro, ele pegou as guias de proteção, colocados anteriormente no coité, e as devolveu para seus donos. Tomou um gole de água e através de cumprimento de mão e um abraço nos despedimos, era hora dele desincorporar.
A paz tomou conta do meu ser e meu coração, como sempre estava encantado, emocionado e muito feliz por estar ali. Já estava querendo relatar as minhas experiências na umbanda há dias e confesso que apesar da vontade sempre ter existido, foi necessário um certo entendimento para iniciar as anotações com maior clareza.
Sou meio desligado e ouvi de algumas entidades que escrevendo seria muito fácil praticar o exercício da fé, e querem saber de uma coisa? Muito axé a todos meus irmãos da corrente, salve! Gratidão eterna! Estou feliz por registrar na história esses momentos lindos, de fé, caridade, discernimento, paz, sabedoria, humildade e felicidade que os dias vem proporcionando.
Saravá,
Vinicius Petruka
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